domingo, 18 de novembro de 2012

Mães de UTI:Como conviver com o drama?


Qual a importância do acompanhamento psicológico na fase em que a mãe está com o filho na UTI?
É absolutamente necessário que a mãe tenha um espaço para contar sua própria história com o filho enfermo, a fim de que ela resgate seu saber materno e a confiança nele, ao passo que a hospitalização e as falas médicas perpassam esse saber, invadindo-o e afetando, por conseguinte, o vínculo mãe-filho, fundamental para ambos, psiquicamente. Esse espaço é possível por meio do trabalho do psicólogo.

Portanto, creio na absoluta importância do relato, a ser alvo de uma escuta analítica adequada pelo psicólogo, com a finalidade de colaborar com o desenvolvimento do favorecer profundo da irrigação da semente da resiliência, capacidade de recuperação emocional fundamental diante de situações dramáticas com um filho.

O psicólogo, no contexto hospitalar, mantendo-se, muitas vezes, simplesmente à disposição, silenciosa e empaticamente, transbordando amor e esperança e permitindo que a mãe compartilhe seu sofrimento, seu peso, sua carga, sua dor, propicia a catarse emocional, ou seja, “o derramar”/“despejar” de sua angústia, que nem sequer cabe em si mesma.

O psicólogo, juntamente com o ser humano sofrido à sua frente, precisa estabelecer um vínculo satisfatório com ele, por intermédio de um investimento psíquico de sua parte, capaz de cumprir seu papel básico: empatia, continência, apoio. Isso alivia a alma, resgata questões fundamentais dos vínculos com o filho, fazendo com que se retome aquilo que podemos chamar de “fôlego emocional” para prosseguir no contexto hospitalar até que se faça necessário. 
Como fica o psicológico da mãe quando um bebê, que acabou de sair de seu útero, tem que permanecer dias ou até meses na UTI? É o mesmo sentimento da mãe com o filho já grandinho, que já teve a convivência familiar, ou é mais intenso?

Qualquer caso de hospitalização de um filho em UTI geralmente traz uma complexidade de sentimentos bastante intensos. Esta questão é muito importante, porque cada mãe, imersa em suas próprias angústias, pode imaginlar, vivencia suas dores, seus impasses, suas frustrações, seus medos e as condições que conduzem a tudo isso de maneira absolutamente diversa de outrem, ainda que tais condições sejam, concretamente, muito parecidas.

Há elementos psicológicos bastante diversos, além da questão da individualidade supracitada, que podem ser considerados como situações comuns, psicodinamicamente falando: a mãe que acaba de ter o bebê, ainda que ele não necessite de uma UTI, sente a separação de seu pequeno, que por nove meses esteve dentro de si mesma. Os sentimentos dela já podem conter ambivalências, como alegria e tristeza, ao mesmo tempo, por ver-se com a barriga vazia, por assim dizer. Então, indubitavelmente, se seu filhinho precisa ser levado para receber um tratamento intensivo, ficando ainda mais longe dela e precisando de cuidados especiais por algum motivo que sempre será preocupante para a mãe que tanto deseja seu filho, ela apresentará uma demanda emocional carente de maiores cuidados.

Qual é a importância da presença da mãe na UTI neonatal, para o bebê?

O bebê, em seus primeiros meses de vida, tem na mãe a continuidade de si mesmo. Portanto, sua presença é de importância vital para ele, sobretudo quando ela pode lhe mostrar todo o seu amor, conversando com ele a respeito do quanto ele é importante para ela, bem como em relação ao fato de ele ter um lugar especial, somente seu, no seio familiar. O bebezinho já é capaz de compreender isso, do seu jeito, pelo tom da voz da mamãe, que ele reconhece. O método Mãe-Canguru, quando o bebê pode ser pego no colo (há casos em que isso é contraindicado pelos pediatras, por algum tempo), e a própria amamentação, quando possível, são maravilhosos para o bebê. No método Mãe-Canguru, o contato pele a pele propicia um verdadeiro alimento de amor e segurança/confiabilidade ao pequenino.



E quanto às crianças maiores? Como explicar a elas sobre o que estão fazendo na UTI sem traumatizá-las? Como lidar com procedimentos dolorosos?Tanto as crianças maiores quanto os bebês carecem de explicações sinceras a respeito do que estão fazendo na UTI. Quando o quadro é mais grave e/ou crônico, deve haver muita sensibilidade e, de preferência, a orientação de um psicólogo a respeito de como deve ser dito, de acordo com cada caso. Para tanto, o psicólogo também precisa ter conquistado já a confiança da mãe ou acompanhante, sendo muito empático, “colocando-se no lugar” de quem estará ouvindo o que precisa ser contado, sempre se considerando os limites para isso. Por exemplo, ainda que a criança tenha sido desenganada, não temos o direito, como psicólogos e nem mesmo como seres humanos, de retirar a esperança nem dos pais e nem do pequeno paciente. O desfecho de cada caso será único e uma verdadeira incógnita.
Foram inúmeras as vezes em que presenciei, em todos esses anos de experiência, surpresas maravilhosas que contradisseram totalmente o que as estatísticas previam. Portanto, há de se ter muito cuidado em não “avançar o sinal”, ao comunicar a criança sobre o que está se passando. Na verdade, cada dia deve ser vivido na esperança de que o dia seguinte será melhor, independentemente do diagnóstico e do prognóstico obtido. Afinal, a vida e seus tropeços ou avanços são mistérios a serem desvendados passo a passo.

Quanto aos procedimentos dolorosos, a sinceridade a respeito de como eles serão é de primordial relevância. De nada adianta dizer que não doerá, se vai doer. Pelo contrário: a criança sente-se traída quando não se lhe diz a verdade. Podemos amenizar o medo e a ansiedade, contando-lhe somente quando estiver exatamente na hora em que se dará o procedimento, sendo isso possível. Ainda mais, podemos lembrar ou informar à criança que é necessário para seu bem e que a dor ou o desconforto passará.

Mesmo que a criança esteja em coma, é preciso conversar com ela! Ela ouvirá; sentirá a presença da mãe, daqueles que a amam! Pesquisas já comprovaram este fato.



No caso das crianças maiores, como criar uma atmosfera agradável e com jeitinho de casa, para que a criança possa abstrair um pouco que está no hospital?
Esta pergunta também apresenta fundamento indiscutível, no sentido de se buscar uma compreensão de fatores que possam amenizar a angústia e os medos decorrentes desse estranho e, normalmente, aversivo lugar.

Todavia, há grandes limites para que se consiga criar uma atmosfera agradável e com jeitinho de casa, infelizmente. O que se pode fazer é levar joguinhos, atividades das quais a criança goste e possa realizar na caminha, televisão, brinquedos que sejam permitidos pela instituição (devido à possibilidade de infecções, alguns materiais não podem entrar na UTI).

A presença da mãe ou outra pessoa em quem a criança confie é importantíssima, sendo que a mãe deve buscar ajuda profissional nessa condição de aflições e receios, a fim de que possa estar o mais tranquila possível para conseguir transmitir mensagens “de coração para coração” de esperança, força para prosseguir em uma luta que terminará.


De que forma as mães com filhos na UTI podem ajudar umas às outras?
A sala de espera da UTI é um lugar onde pode haver trocas de experiências e sentimentos muito salutares entre as mães. Ali, constroem-se amizades, muitas delas para a vida inteira, edificando cada membro deste grupo que se forma naturalmente. Ainda que haja uma diversidade enorme de casos, as mães que ali se reúnem sabem, em alguma medida, o que as demais estão passando.

Falo, aqui, da força do grupo. Nele, as angústias, os medos, as fantasias, as esperanças são todos sentimentos compartilhados. A fé é compartilhada e a vontade de que tudo dê certo uns para os outros parece prevalecer.

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